outubro 20, 2009

Guerrilheiros Imortais- por André Dusek

A imortalidade se constrói no decorrer de uma vida. Um homem ou uma mulher sobrevivem após a morte biológica pela reprodução de sua obra, suas idéias e seus exemplos para as gerações futuras. O médico argentino Ernesto Che Guevara será sempre lembrado pela vitoriosa revolução Cubana e pela sua luta em outros países pela liberdade dos povos oprimidos. O fotógrafo cubano Alberto Korda jamais será esquecido devido à suas fotos que registraram o início da revolução cubana e pelo exemplo profissional que ele se tornou. Os caminhos de Che e Korda em busca da imortalidade se cruzaram.

Em 5 de março de 1960 o jovem fotógrafo Alberto Korda que trabalhava para o jornal cubano Revolución foi cobrir uma cerimônia fúnebre de 136 vítimas de um atentado da CIA em Havana. No dia anterior o cargueiro francês La Courbe que trazia armas belgas para a revolução de Fidel Castro explodiu numa sabotagem no porto de Havana. Na cerimônia, um ar de revolta e indignação marcavam os presentes: Fidel discursava ao lado de Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir no palanque e Korda fotografava a 10 metros com sua Leica . De repente, Che Guevara sai de trás da tribuna e aparece com um olhar expressivo e Korda faz duas fotos. Uma delas se tornaria, sete anos depois, um ícone mundial. Na época o jornal Revolución não usou a foto, entitulada pelo autor de “El Guerrillero Heroico” . Korda sabia da importância daquela foto e a arquivou com o maior carinho.

Cinco meses antes da morte de Che , o editor italiano Giangiacomo Feltrinelli esteve em Cuba e solicitou duas cópias da foto “El Guerrillero”, até então inédita e Korda as cedeu de graça. Com a morte de Che em 1967 a foto apareceu em público pela primeira vez na cerimônia fúnebre em Havana ampliada em tamanho gigante e colocada no prédio do Ministério do Interior. Logo depois, Feltrinelli reproduziu e vendeu um milhão de cartazes com a foto do ”El Guerrillero Heroico” e Korda não recebeu nem um centavo pelos direitos autorais . A partir daí a imagem de Che nesta foto de Alberto Korda virou uma coqueluche mundial até os dias de hoje: bandeiras em manifestações, camisetas, posters, placas, capas de livros e revistas, broches, relógios, medalhas e moedas cubanas. Em Brasília, na Ceilândia, tem ferro velho e oficina mecânica com a foto do “El Guerrillero” na placa out door. Milhares de adolescentes de hoje usam camisetas com o ícone de Che, símbolo de rebeldia e liberdade.
Apesar de não ter recebido qualquer dinheiro pela foto do Che, Korda não se importava. Para ele o mais importante era o respeito e o reconhecimento ao seu trabalho e à Revolução Cubana. Em entrevista à revista ISTOÉ em 1997 ele disse: “É uma satisfação íntima saber que meu trabalho vai transcender minha vida. A história da Revolução Cubana pode ser escrita por mil autores, mas será ilustrada com minhas fotos”. Mais do que dinheiro, Korda queria respeito à memória de Che. Por isso no ano passado, quando viu a foto “El Guerrillero” estampada em anúncio de vodka Smirnoff ele resolveu pela primeira vez processar judicialmente pelo uso indevido da imagem, sem autorização do autor. Indignado, pois Che não bebia, Korda processou a Agência Publicitária Lowe Lintas, criadora da campanha e a Rex Features, empresa que vendeu a fotografia. O tribunal de Londres mandou tirar a campanha das ruas e pagar uma indenização de US$ 50 mil dólares ao autor da foto. Korda doou todo o dinheiro para compra de remédios para as crianças cubanas. “Che faria o mesmo”, disse o fotógrafo.
Alberto Korda na verdade se chamava Alberto Diaz Gutierrez. Adotou o nome Korda no início da carreira em homenagem ao cineasta húngaro Zoltan Korda. No dia 25 de maio de 2001, Alberto Korda estava em Paris sendo homenageado em uma exposição de seus trabalhos, quando sofreu um infarto e morreu, aos 72 anos de idade. Korda deixou viúva e cinco filhos, sendo que um deles, Fidel Alberto, se tornou fotógrafo. Ele foi enterrado em Havana na terça dia 29 com a presença do presidente Fidel Castro. Autor da foto mas divulgada do mundo, Alberto Korda deixou mais do que isso, seu exemplo de vida.
Che vive e Korda não morreu!
André Dusek